Faz sentido o riso provocar o choro?
Tem dias em que, quando eu rio muito, eu choro. Parece que a risada dá um clique dentro de mim que faz os músculos do rosto destravarem e perderem os limites do socialmente aceitável.
risinho de princesa, sem risada de galpão
rosto sereno, sem rugas de choro
Que fique claro que eu não estou me referindo a chorar de tanto rir.
A gargalhada me leva ao pranto vez que outra.
Gargalho e tento disfarçar. Outro dia, ria vendo pela segunda ou quarta vez um episódio isolado de friends deitada para dormir e chorei.
chorei de cansaço, de tristeza por estar cansada há dias, chorei pelos pequenos desrespeitos diários, chorei de sono como criança que quer colo e nem sabe.
Mas disfarcei. Não queria aquele choro sem fim que eu não saberia explicar, que ia pausar o episódio, que ia atrasar meu sono e amanhã eu estaria ainda mais cansada.
No ano novo, viajei com amigos. Eu e o Lucas dormíamos no andar de baixo da casa quando acordei com batidas na minha janela e alguém gritando. Eu gritei mais ainda e comecei a chorar de susto enquanto o Lucas se assustava mais comigo gritando do que com as batidas. Um dos guris estava trancado do lado de fora e nos chamava para abrir a porta, só isso. Simples assim. Já fui acordada assim outras vezes em outras praias e não gritei, nem chorei.
O fato é que passado o susto — ou não — eu comecei a achar a situação muito engraçada, mas quando eu começava a rir, imediatamente a risada virava choro e aquilo virou um looping me provando que nem sem sempre a gente consegue rir — literalmente — das situações depois que elas passam.
Eu não sei por que isso acontece. É como se a gargalhada derramasse graxa no trilho das emoções (que brega) e eu pudesse deslizar até os extremos em um instante só. Nessas eu descubro que estou mais perto do limite do que gostaria: do limite do cansaço, do limite da resistência em relação ao que acho errado. Não como se o limite do quanto aguento na vida fosse ultrapassado, mas o limite daquele dia, daquela semana, daquela período qualquer em que eu estou lá me esforçando, focada para chegar no final, e nem percebo que preciso mesmo é botar para fora.
Este texto foi enviado na minha newsletter, Faz Sentido?. Envio textos mensalmente por lá e, um tempinho depois, eles vêm pra cá. Então este é o #16 Faz sentido o riso provocar o choro? enviado em junho. Clica aqui para receber por email.