Faz sentido contar os anos?
Gerônimo* disse que não entende porque contamos os anos. Por que saber há quantos anos nasci? Para saber que tenho oitenta anos e me preocupar com a morte? O que importa é o hoje, não é?
No mesmo dia em que ouvi Gerônimo, fiz cálculos pensando em previdência privada e me preocupei pela primeira vez com como vou pagar as minhas contas daqui a 46 anos.
Eu tenho dito que tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Tenho assustado meus amigos contando todas em um só fôlego entre um gole de café e uma garfada de doce. É-muita-coisa-ao-mesmo-tempo. Umas boas, outras ruins, mas todas de emoções fortes.
Entre a rapidez dos dias e a vagarosidade dos meses, a gente busca um ritmo que possa fazer sentido pras manhãs cada vez mais pesadas por causa das madrugadas mal dormidas.
Escrevo mais devagar para poder manter daniela** aninhada em meus braços. O que me importa mais nesse exato instante? É no carinho que tenho encontrado a calma.
Dezessete semestres é muito tempo para completar um ciclo ou é o tempo que eu precisava? Maio, junho, julho, agosto e provavelmente setembro e outubro é muito tempo para suportar angústias diversas que se sucedem e se sobrepõem? Alegria e angústia no mesmo peito, no mesmo dia, ao mesmo tempo. Eu sinto o quê?
Alegria e angústia
não existe uma média
Gerônimo disse que, na mata, é preciso aprender a fazer silêncio. Eu queria dizer pro Gerônimo que fora dela também. Silêncio e calma costumam andar juntos por aqui.
O barulho da vida do outro lado da janela, a textura do pelo da daniela e o cheirinho do cangote dela, a temperatura do mate, o som dos dedos no teclado. O tempo passa e não percebo. Talvez devesse ser sempre assim. Não perceber o tempo. Não precisar perceber o tempo. Não tomar um susto pelas horas passadas.
No mundo que inventaram pra nós, parece impossível.
Há de haver jeitos de criar um mundo novo para viver.
Impor o silêncio na força do grito.
*Gêronimo Franco Morinico, Guarani Mbyá, em uma fala na Jornada de Educação Linguística e Literária da UFRGS.
*minha gatinha perfeita.
Este texto foi enviado na minha newsletter, Faz Sentido?. Envio textos mensalmente por lá (às vezes alguns links vão junto) e, um tempinho depois, eles vêm pra cá. Então este é o #30 Faz sentido contar os anos? enviado em agosto. Clica aqui para receber por email.